Ilhéu da Vila

“O mais formoso ilhéu que há nas ilhas” Gaspar Frutuoso[i]

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O ilhéu de Vila Franca do Campo resultou de uma erupção submarina e tem sido esculpida por 4000 anos de marés. Tem uma forma circular com cerca de 150 metros de diâmetro e uma pequena passagem. Várias fendas que ligam a bacia ao mar exterior estão espalhadas pelo Ilhéu Grande. O Ilhéu Pequenino está situado a 20 metros Nordeste do Ilhéu Grande. Ainda há um rochedo conhecido como «Farilhão» e tem 32,50 metros de altura.

O “Anel da Princesa” foi classificado como Reserva Natural a 3 de março de 1983 e é uma área protegida para a gestão de habitats e espécies desde 2008. Está localizada a 500 metros da costa vilafranquense e é considerado uma das Zonas Importantes para as Aves pela organização não-governamental Birdlife Internacional.

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The Vila Franca do Campo islet resulted from a submarine eruption and has been shaped by 4000 years of tides. It has a circular shape with about 150 meters in diameter and a small passage. Several cracks that connect the basin to the outside ocean are around the Big islet. The Small islet is located at 20 meters northeast of the Big islet. There is a rock know as “Farilhão” and has 32.50 meters tall.

The “Ring of the Princess” was classified as a nature reserve on March 3rd of 1983 and it is a protected area for the management of habitats and species since 2008. It is located at 500 meters away from Vila Franca do Campo coast and is considered one of the Important Zones Birds by the non-governmental organization Birdlife International.

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Após a descoberta da ilha de Santa Maria, os marinheiros rumaram entre Noroeste e Norte e deram com a Povoação Velha – atualmente denominada Vila da Povoação.

O início do povoamento da ilha de São Miguel foi comandada por Gonçalo Vaz Botelho e um ano depois encontrou o Ilhéu de Vila Franca do Campo.

Nas palavras do historiador Gaspar Frutuoso “ali defronte saíram em terra e habitaram, a qual semeando e cultivando lhe respondeu com muitas e abundantes novidades”.

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João da Grã, cavaleiro da Ordem de Avis, recebeu a carta da dada a 13 de junho de 1537, pelo 5º capitão donatário da Ilha de São Miguel – D. Manuel da Câmara. No documento constava o propósito do ilhéu de Vila Franca do Campo para “a creação de cabras ou outra qualquer creação e proveito que no dito ilhéu possa melhor fazer”.

Três anos depois, João da Grã pediu a confirmação da dada ao monarca e o privilégio de que teria todo o poder sobre o cone vulcânico inativo.

Em 22 de outubro de 1522 deu-se um terramoto que destruiu a Vila e deu o título de capital a Ponta Delgada. Nesta altura, muitas embarcações serviram-se do ilhéu da Vila como refúgio. Atendendo à importância do ilhéu para o abrigo de barcos, foi criado um plano por forma a que a bacia interior do ex-líbris acolhesse 30 navios, devendo-se rebaixar e alargar o boquete e tapar as fendas que o circundam” – uma interpelação requerida pelo capitão do donatário a D. João III de Portugal[ii]. Apesar da vontade, tal projeto não foi executado.

De 25 a 28 de junho de 1563, Vila Franca sobre uma nova crise sísmica e o ilhéu da Vila volta a ser um refúgio de pessoas e barcos: “muitas pessoas se botavam a nado ao mar, não temendo esse perigo, por evitar o que na terra tinham, acolhendo-se aos barcos e navios ancadorados e ao ilhéu, onde já estava muita gente acolhida”[iii]

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O ilhéu de Vila Franca do Campo como centro de episódios históricos

O ilhéu foi o centro de muitas execuções a mando do marquês de Santa Cruz da Mudela durante a Dinastia Filipina – 1580-1640.

A conhecida Batalha Naval de Vila Franca foi o maior reencontro da campanha de Filipe I de Espanha contra os portugueses. Resultaram mais de 2500 mortos e foi a primeira batalha naval que recorreram aos grandes galeões. Esta ocasião permitiu que os portugueses ganhassem experiência numa embarcação que exigia novas táticas e manobras. Os castelhanos quase que garantiam a sua vitória, porém foi chegado um reforço naval de Castela que ganhou sob a experiência tática do Marquês de Santa Cruz de Mudelo. O enforcamento de soldados franceses no alto do ilhéu da Vila visava servir como repelente àqueles que pretendessem cometer os mesmos maus comportamentos ou outro tipo de atitude que merecesse castigo, como refere Frutuoso: “enforcando dezoito ou dezenove franceses mancebos bem dispostos. Dizem ser o intento do Marquês em os mandar enforcar no alto do ilhéu, para todos os que passassem ao longo dele e da terra, vendo aquela justiça não usassem semelhantes obras, e temessem outro tal castigo.” [iv]. A derrota francesa refletiu numa mudança de atitude política para com Castela.

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O ilhéu de Vila Franca passa a ter uma maior importância e recebeu obras de melhoramento no acesso e na construção de um muro na entrada que não permitisse a entrada de ondas na caldeira.

No outono de 1597, a ilha de São Miguel foi atacada pela armada inglesa, pela liderança de Robert Devereux, 2º conde de Essex. Gonçalo Vaz Coutinho defendeu a ilha verde dos ingleses, referindo na História do Sucesso que a sua atitude ofensiva, fez com que as lanchas recolhessem aos navios ingleses e fosse de todo evitado o ataque pela armada inglesa.

Uma lei municipal em 1612 pôs fim à criação de gado no ilhéu da Vila, sendo obrigada a pagar vinte cruzados a pessoa que não respeitar esta limitação. Foram construídos vários mourões de cerne para a amarração de embarcações.Os anos passaram e a propriedade da ilha vulcânica passara de mão em mão, ao sabor do modelo governativo português.

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Na onda reformadora de Marquês de Pombal, foi criada a Capitania Geral dos Açores em 1766. Esta nova autoridade garantira mais autonomia nos estudos e na aplicação do resultado destas investigações, porém não conseguiram a execução por falta de fundos.

Na década 30 do século XIX foi fundada a Companhia do Porto de Abrigo Marítimo no Ilhéu de Vila Franca do Campo. João António Garcia de Abranches tomou a iniciativa, agora dotada de estatutos com aprovação real da D. Maria II de Portugal. A coroa portuguesa entusiasmada com a acção concedeu gratuitamente um padrão e uma imagem de Nossa Senhora da Glória para ser colocada numa ermida que haveria de ser construída no ilhéu.

Em 1846 o ilhéu passa a arrematação e foi licitado por Simplício Gago da Câmara e denominou-o o ex-líbris como “Caís das Casinhas”. Foi construída uma casa de veraneio em 1933. Após a compra, Simplício mandou plantar vinhas e a construção de uma vigia de apoio à baleação no seu ponto mais elevado. Eram abatidas no ilhéu toninhas às centenas.

A 30 de abril de 1924, António Manuel dos Santos adquiriu o ilhéu por 14 mil e 400 contos e prometia aproveitamento turístico daquele local.

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O ilhéu de Vila Franca do Campo foi determinado como uma Reserva Natural, por forma a salvaguardar o património pelo Decreto Legislativo Regional 3/83 de 3 de março, publicado no Diário da República n.º 10, 1ªsérie, de 29 de março de 1983. Em 2008, com a publicação do diploma legal que regulamenta o Parque Natural de Ilha de São Miguel, o Ilhéu de Vila Franca do Campo foi reclassificado como “Área protegida para a gestão de habitats ou espécies”, integrando ainda a “Área protegida de gestão de recursos da Caloura-Ilhéu de Vila Franca do Campo”, mantêm-se no entanto os objectivos que levaram inicialmente à sua classificação como Reserva Natural, privilegiando-se a manutenção de valores naturais e a gestão sustentável de recursos

 

 

 

[i]  Gaspar Frutuoso. Saudades da Terra. Livro IV, Vol. I, p. 57.
[ii] ABRANCHES, João António Garcia de. Memória Concernente à Construção da Doca do Ilhéu de Vila Franca do Campo na Ilha de São Miguel. Ponta Delgada, 1834
[iii] Gaspar Frutuoso. Saudades da Terra. Livro IV, Vol. II, p. 213.
[iv] Gaspar Frutuoso. Saudades da Terra. Livro IV, Vol. III, p. 79.